Fazer pesquisa é viver
23 de novembro de 2009 Processocom
Guaciara Barbosa de Freitas
A decisão de realizar pesquisas acadêmicas, muitas vezes impõe a pessoas, cada vez mais jovens, uma espécie de escolha, colocada por elas próprias ou pelos outros: fazer pesquisa ou viver. Durante minha curta trajetória de formação no mestrado e no doutorado, algumas vezes acreditei que devesse realmente optar por um destes caminhos. Essa idéia se dissipou, à medida que a vivência em um ambiente de pesquisa mais maduro revelou que fazer pesquisa é viver.
Não há receita de como tornar-se bom pesquisador, bom cientista, mas aprendi que dois ingredientes são fundamentais: paixão e alegria. Tais componentes não invalidam o rigor e à disciplina indispensáveis ao desenvolvimento da ciência e à boa formação acadêmica. Eles estão no campo maior no qual a pesquisa científica se insere, a vida. Afinal, nas ciências naturais ou nas ciências humanas, o que deve motivar o pesquisador é, primeiramente, a contribuição do trabalho dele para a vida ser melhor: as vidas individuais, a coletividade, a boa humanidade.
No caminho da pesquisa, ainda existem mestres dispostos a ensinar que para o estudante-pesquisador aprimorar o conhecimento, não deve haver nada além das horas de estudo, das idas a campo, dos momentos de reflexão solitária, de debate com os pares, das salas de aula, dos relatórios, dos compromissos com a escrita. De fato, essas e outras práticas constituem o ofício, mas nada disso requer a abdicação de viver a vida: reunir-se com os amigos e amores, dançar, saborear boas comidas e bebidas, casar, ter filhos (quando se tem esse desejo). Tornamo-nos melhores pesquisadores, melhores dentistas, médicos, pedreiros quando somos homens e mulheres felizes com aquilo que fazemos.
A escolha, portanto, não tem de ser entre a família e a dissertação, entre a esposa e a tese, entre o cuidado com o filho ou o amigo doente e a viagem para o congresso, porque quando colocamos as coisas nos termos excludentes do “ou, ou”, adiante podemos lamentar a opção feita. Vale a pena desdobrar-se em busca do equilíbrio entre o que se tem e o que se deseja alcançar. Observo que uma das práticas do mundo acadêmico capaz de ajudar no encontro deste equilíbrio está na constituição de grupos de pesquisa.
Refiro-me a grupos de pesquisa que funcionam para além das formalidades burocráticas, aqueles que conseguem reunir razão e sensibilidade, intelecto e afetividade. Grupos desse tipo ajudam os pesquisadores a compartilharem descobertas, dúvidas, alegrias e aquelas angústias, típicas dos momentos em que parece não haver solução para um capítulo, uma idéia, uma linha teórica, uma abordagem metodológica.
No interior do grupo de pesquisa Processocom, por exemplo, às vezes me distancio para observar o funcionamento de operações que não são estritamente acadêmicas e encontram-se na dimensão da solidariedade, do companheirismo. Percebi então, que isso resulta na existência do grupo como um organismo vivo, ativo. Noto que a partilha efetivada em grupos de pesquisa como este resulta em duplo benefício para quem dele participa: estimula as produções individuais e desenvolve as habilidades necessárias para se trabalhar o coletivo. Também deve deixar bons frutos para quem não o integra diretamente, mas dele colhe materiais construídos a partir de valores que estimulam o conhecimento, mas, sobretudo o saber.