O ROMPIMENTO DA BARRAGEM DE FUNDÃO EM MARIANA (MG): o acontecimento e suas implicações
18 de junho de 2018 Júnior Melo da Luz
Claudiane Aparecida de Sousa
Doutoranda do PPGCC da Unisinos
“Descobriram Mariana da lama que cobria Bento Rodrigues
E do minério, descobriu-se o mistério
Que o CAPITAL há muito tempo escondia
(A sete chaves)”. JWPapa
Intitulada como o maior crime socioambiental do país, aquela fez o povoado inteiro de Bento Rodrigues desaparecer, 19 vítimas fatais e mais de 600 famílias desabrigadas. A perda não pode ser sintetizada somente em danos materiais, vez que o cidadão perdeu também seu vínculo cultural, sua noção de vizinhança, a identidade – isto é, o pertencimento a uma história (simbólico), a um ambiente que moldava sua forma de viver, juntamente com as recordações acumuladas no decorrer de sua vida. Igualmente, subtraído em sua autonomia, cada sujeito e sujeita convivem sob uma consternação social atribuída pela vinculação em relação à Samarco. “Não fomos nós só os atingidos, o Brasil na verdade, o mundo inteiro sofreu e com o crime”. Luzia da Consolação Cota Ribeiro – moradora atingida.
Ato contínuo, quando sobrevém um acontecimento como o mencionado, não é excluído de qualquer que seja o noticiário. A partir disso, percebe-se que a veiculação e/ou menção desse acontecimento, quando analisada do ponto de vista linguístico, foi e é propagada por distintos gêneros do discurso. Igualmente, como a comunicação faz parte da vida humana, é fundamental ponderar que os gêneros do discurso estejam presentes em todas as práticas desenvolvidas pelas atividades humanas. Mikhail Bakhtin (2003) assevera que cada gênero consente intenções distintas referentes às ações humanas que integram a construção linguística de uma sociedade. À vista disso, distintos enunciados podem dispor um mesmo objeto, mas oferecer vários sentidos, bem como sua estrutura formal e de diálogo com diferentes enunciados, discursos e sujeitos, observe: “Neste momento, estamos sendo muito questionados, mas continuamos firmes para esclarecer os fatos.” [1]·.
Verifica-se que a composição transcrita no trecho acima demonstra a não anuência com a inquirição subordinada: “estamos sendo muito questionados”, e, prontamente, usaram o conectivo “mas”, para engrandecer discursivamente a aversão em reconhecer as conjunturas atinentes ao acontecimento. Destaca que, ante os questionamentos, os fins corporativos que geriram a Samarco seguem: “continuamos firmes”. Ademais, a solidez se encaminha aos “esclarecimentos” e não a uma comoção ativa para recompor a forma de se instituir. Contudo, apesar do fragmento ter sido noticiado no site da Samarco em dezembro de 2015, continua mais atual do que nunca, vez que visitei Bento Rodrigues em 09 de junho de 2018, lá, o segurança da Samarco trazia o mesmo discurso na fala, ou seja, as intenções discursivas variam de acordo com o objetivo a ser alcançado.
Dito isto, na caminhada da pesquisa exploratória, sai do olhar normativo e dedutivista do direito para o olhar transmetodológico e da cidadania comunicativa. Busco compreender os sujeitos e sujeitas que estão à margem do princípio da dignidade da pessoa humana esculpido no artigo 1º, III, CRFB que é tão propagado e falado na pós-modernidade, mas não apresenta sua eficácia no discurso do Flávio Roberto Barbosa, atingido da região de Gesteira – “Eu fiquei até doente. Não consegui o cartão. Perdi minha casa por compreto, tinha 13 cômodos. Perdi o curral. Eu dependia dele para viver”. Assim, nos passos das interações entre sociedade e atingidos, sigo o caminho, observo as transformações acontecendo para, a partir daí, ir de encontro aos processos sociais, e, posteriormente verificar como esses constroem os processos midiáticos.
[1] Disponível em: https://www.samarco.com/noticia/comunicado-91/. Acessado em junho/18.