Notas sobre ficção científica (II) – Verne, Wells e Lang

20 de junho de 2017 Processocom

Fabio Bortolazzo Pinto

Doutorando do curso de Ciências da Comunicação da Unisinos

Confira a primeira parte.

Com a Revolução Industrial, na segunda metade do século XIX, o avanço do conhecimento técnico-científico proporciona a um autor como Julio Verne estabelecer fértil diálogo entre a ficção e a ciência, a ponto da primeira inspirar criações na segunda. O terreno era tão propício que a televisão, o submarino e o helicóptero imaginados e descritos por Verne em sua extensa obra acabariam servindo de modelo para a indústria que os concretizaria. O século XX se aproximava e com ele a sensação de que a engenhosidade humana não encontraria limites. Parecíamos haver atingido uma espécie de ápice evolutivo, antecipado, em muitos aspectos, pela ficção. Em dezenas de narrativas como Viagem ao centro da terra (1864) e Da terra à lua (1865), Julio Verne povoou de aspirações e desejo de conquistas o imaginário dos leitores ocidentais.

Algumas décadas depois, às vésperas da Exposição Universal de Paris[1], em outro ponto da Europa, o inglês Herbert George Wells contrapunha-se ao futurismo otimista de Verne. A atmosfera lúgubre das fábricas, a miséria e o sofrimento da classe trabalhadora chamam mais a atenção de Wells que a possibilidade de chegar a Marte – de onde, aliás, viria a ameaça descrita por ele em A Guerra dos Mundos (1898). Sua ficção distópica encontra leitores, principalmente, nas classes populares, justamente aquelas com pouco acesso às benesses do avanço técnico-científico.

Praticamente destruída a ideia de ápice da evolução humana pela selvageria da Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918), em 1927, as classes populares, então compreendidas como facilmente manipuláveis por líderes carismáticos e palavras de ordem[2], são retratadas por Fritz Lang naquela que podemos considerar a primeira grande produção cinematográfica de ficção científica: Metrópolis.

Ilustração do desenhista brasileiro Henrique Alvim Corrêa (1876 – 1910) para a edição belga de A Guerra dos Mundos (1906)

[1] Grande feira de variedades acontecida em Paris, em 1900, em que foram exibidos os mais avançados produtos industriais de países como Rússia, Japão e Itália e Hungria, as ‘ações civilizadoras’ da França, Inglaterra e Holanda junto às suas colônias e, com grande alarde, o uso da eletricidade para iluminação de ambientes externos e transmissão de energia. Tratava-se, em suma, de celebrar os grandes feitos do século XIX e aqueles que o futuro parecia destinar à civilização.

[2] De acordo com autores como Gustave Le Bon, que defende essa ideia em Psicologia das Multidões (1895) e Sigmund Freud que, inspirado na obra de Le Bon, vai mais longe, percebendo a importância dos elementos simbólicos na constituição da ‘mentalidade das massas’, conforme descreve em Psicologia das Massas e a Análise do Eu (1921).

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