Ossessione: a herança expressionista no cinema noir italiano

18 de maio de 2017 Processocom

Prof. Dr. Alexandre Rossato Augusti

Prof. Adjunto do curso de Comunicação Social – Jornalismo (Unipampa)

Pós-doutor em Comunicação e Informação (UFRGS)

A obra cinematográfica Obsessão (Ossessione, 1943), dirigida pelo famoso cineasta Luchino Visconti, pertence ao período do noir clássico italiano. É um filme emblemático para o gênero, pensando-se a produção da Itália. Tem base na obra literária The postman always rings twice (1934), de James M. Cain. Houve ainda duas versões cinematográficas americanas: The postman always rings twice (O destino bate à porta – Tay Garnett, 1946) e The postman always rings twice (O destino bate à sua porta – Bob Rafelson, 1981), que têm também características particulares, inclusive pertencendo a última a um outro período, considerando-se portanto neonoir.

A narrativa de Ossessione conta a história de Gino Costa (personagem interpretada por Massimo Girotti), que chega como vagabundo, na boleia de um caminhão, à trattoria (tipo particular de restaurante) do senhor Giuseppe Bragana (Juan de Landa). Logo que encontra a mulher de Bragana, Giovanna (Clara Calamai), estabelece-se uma forte atração entre Gino e ela, com os elementos beleza e sexo compondo um quadro hedonista, que provoca as desventuras dessas personagens.

O presente texto, entretanto, propõe destacar brevemente um elemento do cinema expressionista que influenciou de forma muito determinante o cinema noir, sendo explorado com maestria por Visconti, em Ossessione: as sombras.

Para tanto, aponta-se uma cena em que Giovana está cantando, dentro da Trattoria, despertando assim a atenção de Gino, que está do lado de fora consertando a bomba d’agua. O canto o atrai e ele se dirige para a porta do estabelecimento. Ao se aproximar, vê-se que está acompanhado de sua sombra. Conforme Nazário (1983)[1], a sombra representa a metáfora do inconsciente, do lado obscuro da mente, daquilo que é reprimido. O autor defende que é característica daquelas personagens exiladas pela lei, pela natureza e pelo Bem; das que vivem na clandestinidade. Temos aqui tanto a sombra como indicador do futuro negro que cerca as personagens, como a evidência do ambiente externo, iluminado pela luz solar, em contraposição ao ambiente escuro em que Gino está prestes a entrar. Essa atitude vai determinar sua sorte, como se percebe adiante.

Legenda: Gino vai ao encontro de Giovanna, acompanhado por sua sombra perturbadora. Crédito: fotograma do filme

Quando Gino fecha a porta do restaurante, cessa o canto de Giovanna, dando-se lugar a uma trilha de suspense. Gino vai até a cozinha, onde se encontra a femme fatale, que se apoia à mesa, numa postura provocante. O corte no plano, que ocorre neste momento, e as performances que o sugeriram, remetem claramente à ideia de que o casal fará sexo. Algo que não era mostrado explicitamente, mas comumente insinuado de forma muito eficaz no cinema noir. As sequências seguintes, que mostram o comportamento mais íntimo entre as personagens, além de Gino se lavando e penteando o cabelo, não deixam dúvidas quanto à consumação do ato sexual.

Legenda: Giovanna se coloca à disposição de Gino, o que sugere sua postura e olhar provocantes. Crédito: fotograma do filme

[1] NAZÁRIO, Luiz. De Caligari a Lili Marlene: Cinema Alemão. São Paulo: Global. 1983.

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