Classificação indicativa não é censura
7 de junho de 2016 Processocom
Nessa quarta-feira (08/06) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2404, que pretende revogar o artigo 254 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), entrará na pauta de votação do Supremo Tribunal Federal (STF). A ação que foi movida pelo PTB coloca em cheque a classificação indicativa (regulamentada pela portaria 1220/2007), questionando a constitucionalidade do artigo 254 do ECA ao dizer que a Classificação Indicativa é um tolhimento à liberdade de expressão. Na ADI consta que a expressão “em horário diverso do autorizado” iria contra o texto da Constituição Federal, já que entraria em conflito com o direito a liberdade de expressão.
Atualmente, a classificação indicativa serve basicamente para orientar os responsáveis pela criança/adolescente sobre o teor dos conteúdos/programas que serão veiculados na programação. As faixas de classificação são: Livre, Não recomendado para menores de 10, 12, 14, 16 e 18 anos. Em sua maioria, a classificação é feita levando em conta a intensidade das cenas de sexo, violência e consumo de drogas. A avaliação dos programas é feita por analistas das áreas de Psicologia, Direito, Comunicação Social e Pedagogia, tendo como premissa a objetividade da análise (afastando assim avaliações moralistas), e serve somente para os espetáculos, não sendo aplicada aos conteúdos jornalísticos das emissoras.
A classificação indicativa não serve para proibir nenhum tipo de obra e também não sugere cortes (o que não configura censura). O objetivo principal, como já relatado, é alertar os responsáveis sobre as adequações do programa, bem como a organização na grade de programação de acordo com o direito ao resguardo da infância (há horários para programas classificados para maiores de 18 anos, baseados na legislação prevista no ECA). O atual modelo adotado no país prevê, inclusive, que as emissoras apresentem uma autoclassificação de seus conteúdos, adequando-se às regras da classificação indicativa. Essa média existe em quase todo o mundo, não sendo apenas uma política brasileira. Países como México, Alemanha, França e Colômbia utilizam sistemas mais rigorosos para proteção da infância e adolescência, tendo inclusive proibição de propagandas publicitárias destinadas ao público infantil em canal aberto.
Entidades da Sociedade Civil, como o Instituto Alana, ligadas à proteção da infância e dos direitos humanos, lançaram a campanha “Programa Adulto em Horário Adulto” contra a aprovação da ADI. O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), em nota pública, defendeu os direitos da criança: “Este Conselho entende, no entanto, que os direitos não são absolutos e que apenas se for tomada como tal é que a liberdade de expressão pode ser considerada atingida pela classificação indicativa. Isso porque a restrição promovida pela classificação é mínima, relacionada exclusivamente ao horário de exibição dos programas, não a livre produção e circulação deles”.
O Brasil assinou ao longo dos anos diversos tratados sobre a proteção integral da infância. Modificar a classificação indicativa, deixando a cargo das emissoras escolherem o horário em que os programas irão ao ar, fere muitos destes direitos assegurados. Segundo alguns ministros, que participaram do debate do processo em novembro de 2015 (suspenso a pedido de vistas do presidente do supremo Teori Zavascki), o dever de proteção moral das crianças e o direito a ampla liberdade de expressão não são incompatíveis. Em declaração, o magistrado Edson Fachin disse que “o artigo 254 é constitucional, mas há um problema de interpretação do vocábulo ‘autorizado’ da referida norma”. Fachin propõe uma nova interpretação da expressão e não a inconstitucionalidade do artigo.
O Ministério Público Federal e a Procuradoria Geral da Republica são favoráveis à manutenção da norma, já que a partir dos tratados e convenções assinadas por diversos países entende-se que a classificação indicativa não viola a liberdade de expressão. O formato brasileiro utilizado atualmente já foi defendido pela Organização das Nações Unidas (ONU), que declarou ser uma forma exemplar.
O sujeito infantil não ressignifica conteúdos da mesma maneira que o adulto. Precisa-se pensar na exposição do publico infanto-juvenil a conteúdos que possam prejudicar seu desenvolvimento. Temos visto uma onda de pensamentos conservadores em relação ao ensino e aos contextos em que estão inseridas as crianças, sendo um exemplo a redução da maioridade penal como controle da violência social, bem como o projeto de uma Escola sem Partido.
A CNDH vem fazendo apelos para que a sociedade defenda o direito das crianças e adolescentes. Precisam existir formas de “controle” da mídia e o que temos no momento está sendo eficiente, segundo pesquisa da UNICEF de 2012 que mostra que 90% dos responsáveis levam a classificação indicativa em conta na hora de deixar os filhos assistirem um programa. A exposição midiática precisa ser analisada, assim como é direito da escola ensinar as crianças sobre o mundo.
Esses apelos são de extrema importância, pois o que se tem visto é que, para as grandes emissoras de televisão do país, apoiadoras da ADI, a classificação tem diminuído patrocínios, ou seja, eles não estão preocupados com a formação das crianças e sim com o “lucro”. As emissoras não estão interessadas na criança/adolescente, eles querem audiência sem levar em conta o impacto desses conteúdos. Até o momento, não consigo me conformar com a falta de desenhos animados na grade de programação da Rede Globo (isso mostra que a maior emissora do país não está preocupada com a construção da infância).
Referências:
SECRETARIA NACIONAL DA JUSTIÇA. Classificação Indicativa: Guia Prático. Brasília: Ministério da Justiça, 2007. Disponível em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/comunicacao/guia-pratico-da-classificacao-indicativa>. Acesso em: 07 jul. 2016.
MARTINS, Helena. STF volta a julgar constitucionalidade da Classificação Indicativa. Carta Capital, São Paulo, 06 jun. 2016. Disponível em: < http://www.cartacapital.com.br/blogs/intervozes/stf-volta-a-julgar-constitucionalidade-da-classificacao-indicativa>. Acesso em: 07 jun. 2016.