Na Exposição Origem, de Itamar dos Anjos: hibridismo étnico-cultural como elemento fundante das produções artísticas

4 de maio de 2016 Processocom

Helânia - 04-05-2016 - Imagem 1

Helânia Thomazine

Em janeiro de 2016 participei da exposição de artes plásticas Origem do artista caravelense Itamar dos Anjos, que assinala o nosso hibridismo etnocultural, especificamente os saberes construídos a partir das matrizes indígenas e africanas. Como um griô, ele traz para si a função de “guardião” e de socializador do legado histórico, mítico e cultural de povos nativos e africanos, expressando de forma singular essa mestiçagem tão presente em nossas espiritualidades e comportamentos; enfim, em no nosso modus vivendi.

A exposição “Origem” tem como referencialidade a primeira peça de teatro encenada pelo grupo Umbandaum, no início da década de 1990, em Caravelas (BA). Na produção do espetáculo Origem, teve como tônica o reconhecimento e a valorização de saberes ancestres.

Integrado ao Umbandaum e ao programa artístico e educativo Arte Manha, Itamar vem adotando estratégias culturais suscitadoras de sentimento de valorização das culturas negras e nativas, assim também dos sujeitos que vivenciam essas experiências.  Portanto, sua arte tem sido colocada a serviço dessa militância, tornando possível assim a visibilidade daquilo que tem sido invisibilizado pela globalização dissolvente. Nesse seu fazer artístico encontramos eco do pensamento de Tício Escobar ao dizer que “a arte não esclarece a realidade, mas intensifica a experiência que se tem dela e permite, desse modo, descobrir flancos invisíveis para um olhar frontal”.

As 17 telas apresentadas na coleção Origem revelam a riqueza cultural dos diversos grupos étnicos da Bahia, ao expressar as suas religiosidades, seus rituais, suas ciências e artes. Em várias telas vê-se a forte identificação do artista com o mundo indígena e afro-brasileiro, reforçando o hibridismo étnico-cultural como elemento fundante de suas produções artísticas, assim como dos sujeitos.

Helânia - 04-05-2016 - Tela O Começo

Para entender a sua arte é preciso abrir mão da concepção de sujeitos separados, segregados, abraçando-se a ideia de uma identidade cultural plural, híbrida e inclusiva, forjada na coletividade e no aglomerado de diversos elementos de várias matrizes. Assim, em sua arte cabe todas as cores, formas e pontos que sejam capazes de traduzir a pluralidade e a incompletude ao mesmo tempo. Sugerindo, assim a condição de ser como um estado de devir, de abertura e de inclusão. Portanto, a exposição Origem evoca a ideia de formação do ser como um processo aberto, uma humanidade em construção pela pluralidade. A identidade cultural não como algo acabado, mas como algo sempre em processo; algo que segue sendo.

Tela: O Começo

A cosmovisão e a emotividade do artista estão presentes nas cores fortes, quentes e alegres, nos traçados firmes e nos pontilhismos que delicadamente recobrem todas as formas humanas, vegetais e espirituais. Tais escolhas aproximam as suas obras da tendência expressionista, em que a objetividade é suplantada pela subjetividade. Apesar dessa leitura, não se pode enquadrar o seu trabalho em um único estilo, pois Itamar utiliza ao mesmo tempo da experimentação do expressionismo, do cubismo e dos conhecimentos de estética de tradições afro-brasileiras e indígenas. Uma arte produzida a partir da mobilização de diferentes recursos culturais de matrizes indígena e afro-brasileiras.

Helânia - 04-05-2016 - Morte das Águas

Tela: Morte da Água

A exposição Origem se traduziu para mim como um convite ao encontro com uma poética colorida em que podemos sentir e pensar o nosso enraizamento e a nossa humanização. Assim, as telas se configuram também como uma (re)significação das experiências do movimento Arte Manha, entrelaçando a essa temática engajamentos, quando visualizamos nelas denúncias às ingerências com a natureza, à intolerância à diversidade, a tentativa de massificação da cultura e o desrespeito à diversidade. O artista Itamar mais que enunciar o direito à diferença e à diversidade étnico-cultural, vai na contramão do ideal colonizador, retomando a perspectiva da descolonização. Na sua descolonização as culturas indígenas e afro-brasileiras são consideradas a partir dos sujeitos que as vivenciam, de suas cosmovisões; por fim, das formas como os sujeitos e seus saberes foram e têm sido construídos.

                                 Tela: Dandara                                                                                 Tela: Mãe-Terra

Helânia - 04-05-2016 - DandaraHelânia - 04-05-2016 - Mãe-Terra

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