Lost para estudar nas férias
1 de fevereiro de 2010 Processocom
Taís Seibt
A Escola de Design da Unisinos, em Porto Alegre, recebeu cerca de 100 fãs de Lost no dia 12 de janeiro. Durante duas horas, eles ouviram, atentos, o que tinham a dizer Francisco Machado Pereira sobre a mitologia da série, André Conti Silva sobre roteiro, e Daniel Bittencourt sobre os desdobramentos transmidiais de Lost. Adicta da série, que é como se fosse um vício, estive lá com ouvidos não só de fã, mas também de acadêmica.
No ar há cinco temporadas, Lost já inspirou dezenas de trabalhos de conclusão de curso na área de comunicação, inclusive o meu, embora esteja inclinada a estudar outro tema. Para tirar a prova real, desafiei-me a escrever um artigo sobre a série nestas férias letivas. O debate veio em boa hora, embora não tenha reservado grandes revelações para um fã interessado, daqueles que compra livros, acompanha blogs e está assistindo todas as temporadas de novo para chegar afiado ao início da sexta (e última), como é meu caso. Mesmo assim, reforçar algumas percepções sempre ajuda a espiar um pouco além no horizonte.
Lost está povoado de conhecidos mitos da humanidade, de diferentes épocas e crenças, entre as quais chamam atenção estátuas egípcias e personagens com nomes bíblicos – sem contar os que têm nomes de filósofos, como John Locke, Danielle Rousseau, Desmond Hume. Há ainda a chuva que cai ou cessa em momentos cruciais da série, a sequência numérica repetida insistentemente (e uma das mais jogadas na Mega Sena), a sugestão de que os sobreviventes foram “escolhidos” pela Ilha e a eterna dúvida sobre o que é aquela Ilha, a que universo ela pertence – ou a que época, já que eles pulam no tempo o tempo todo.
Foram destacados também a estrutura do roteiro, que contribui para reforçar o misticismo da série, e os desdobramentos transmidiais de Lost, que não se limita ao que passa na TV, seja por iniciativa dos produtores, ao lançarem cartazes sugestivos como o que reproduz a cena da Última Ceia com personagens da trama, seja por iniciativa de fãs, que povoam blogs e sites de relacionamento apresentando sua teoria para o fim da história.
A mim, no entanto, o que interessa em Lost é a manifestação das polaridades, na perspectiva da semiótica da cultura, trabalhada pelo pesquisador russo Ivan Bystrina. A estrutura da maioria dos episódios da primeira temporada reveza flashes entre dois pólos: enquanto Claire traz Aaron à vida na floresta, Boone morre nas cavernas; enquanto Shannon tem um encontro romântico com Sahid, Sun e Jim estão brigados. No início da primeira temporada, o personagem John Locke, que embarcou no vôo 815 paralítico e recuperou-se misteriosamente na Ilha, ensina Walt a jogar gamão. Locke apresenta ao menino as peças branca e negra com ênfase quase sarcástica. No decorrer das temporadas, o bem e o mal parecem se valer do mesmo personagem para cumprir uma missão ainda desconhecida.
Objeto de estudo para a academia e fonte de inspiração para realizadores, Lost soube se aproveitar da mudança de hábitos dos telespectadores para potencializar a audiência não só na TV, mas na internet, no celular, na literatura, na filosofia, nas rodas de conversa entre amigos. E até me inspira a estudar nas férias.
debate: http://www.estudiodeconteudo.com.br/tag/mundo-cult/
promo Lost 6: http://www.youtube.com/watch?v=C56Lgl6DorM