Ambiências comunicacionais e vivências midiáticas digitais
10 de abril de 2008 Processocom
Fotos: Juracy Lacerda de Andrade
Texto: Ariadna Straliotto
Ambiências Comunicacionais e Vivências Midiáticas Digitais – Conexões e sentidos entre espacialidades pessoais, arquitetônicas e digitais: um estudo da experiência dos internautas em telecentros de acesso público gratuito dos projetos Paranavegar e Faróis do Saber – Curitiba (PR) este é o título da tese, desenvolvida pelo professor de Juciano de Sousa Lacerda, cuja sessão pública de defesa, na Unisinos, mereceu 5 horas e meia de um debate denso sobre os aspectos que envolvem a lógica dos telecentros, os modos de uso destes espaços pelos sujeitos e a política de inclusão digital. A avaliação iniciou às 14h07, na tarde do dia 28 de março.
Na banca cinco avaliadores dialogaram com o acadêmico: Theóphilos Rifiotis, da UFSC, Bruno Fuser, da UFRJ, Fabrício Silveira, Suely Fragoso, ambos do corpo docente da Unisinos, e Efendy Maldonado, orientador do trabalho.
A problemática de pesquisa visava trazer mais visibilidade e compreensão do processo de midiatização digital a partir das vivências socializadas no espaço do telecentro, no cotidiano das pessoas. Em Barcelona, no telecentro de Catalunha, o pesquisador tomou contato empírico prévio com o tema. As conversas, as entrevistas em profundidade , as observações de uso da internet, foram realizadas em Curitiba e resultaram em um diário de campo textual e fotográfico,uma base plurimetodológica do estudo. O mapeamento do uso da internet, por exemplo, foi feito com 136 usuários, em 5650 minutos. Além dessas navegações exploratórias, o conhecimento de projetos mantenedores de telecentros em Porto Alegre e São Paulo forneceram ao estudioso um panorama sobre a construção do ambiente digital a partir de políticas das prefeituras. Um histórico sobre a sociedade da informação na América Latina também integra o trabalho. A tese faz interconexões entre as espacialidades, as ambiências midiático comunicacionais.
Após meia hora de defesa, cada argüidor teve exatos 30 minutos para sua avaliação, e o acadêmico direito a meia hora de réplica.
Veja as fotos
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Avaliação da banca
Theófilos Rifiotis apontou que o telecentro é pequeno, mas tem grande visibilidade, por isso deve ser estudado, para ser base do trabalho de decisão política, e completou afirmando que “o Estado moderno decretou sua própria falência: faz leis e não dá conta de cumprí-las”. O professor criticou o pressuposto de que a aquisição de um computador muda a vida de uma pessoa, “a idéia de inclusão digital não pode ser simplista”. Segundo Juciano, as políticas são importantes, porém nem sempre correspondem às necessidades das comunidades. “As políticas produzem os espaços e as pessoas criam articulações, se apropriam”, já que não basta oferecer o acesso , é imprescindível “ter estratégias de instrumentalização” para que os usuários sejam incluídos digitalmente.
“As contribuições que o seu trabalho traz são fantásticas”, disse Bruno Fuser, “é um estudo sobre a o papel de intervenção social dos telecentros”. O avaliador também questionou o conceito de exclusão social em um país, onde 66% da população tem telefone celular. Ainda assim, Fuser ressaltou a importância da possibilidade de universalização do acesso à internet e, conseqüentemente, aos bens culturais.
Fabrício foi rápido, claro e objetivo ao destacar a disposição para coleta e cruzamento de dados e a discussão frontal e substancial do conteúdo como méritos do investigador. Sem demora, o avaliador listou uma série de equívocos formais cometidos no trabalho, tais como erros de citação, de notas de roda-pé, uma errata de três folhas e a retomada da teoria e de citações no capítulo da conclusão. Questionou o aluno sobre o motivo dos erros, apontando, inclusive, impropriedade de conceitos, como quando o autor usa o conceito de semiose pessoal, baseado na semiosfera de Lotmann, quando deveria aderir a idéia de explosão do mesmo teórico. Fabrício ainda frisou a ausência do paradigma pessoal do autor. “Você se eximiu de uma postura crítica, faltou o Juciano crítico no texto”.
Em resposta, Juciano admitiu que a maioria dos erros foi fruto da corrida contra o tempo, da revisão apurada. Ele ainda brincou: “A professora Fernanda Cruz é testemunha, me ajudou na revisão”. O professor alegou que o diálogo com os teóricos na conclusão foi tido como necessário para retomar os principais posicionamentos e tensionamentos expostos no trabalho. Juciano afirmou que a noção de explosão está implícita na tese e pode ser verificada na noção de encontro de fronteiras semióticas. “A minha proposta não era tratar a noção de semiose como algo pessoal, mas sim abordar a semiosfera pessoal, dentro da qual há a semiose”, justificou.
O relógio já marcava 18h15, quando a doutora Suely Fragoso iniciou sua argüição suscitando, em breves palavras, a trajetória do candidato a doutor, desde a seleção do mestrado até a qualificação de sua tese, e salientando que Juciano é um estudioso que tem participação ativa no âmbito acadêmico, publicando vários artigos por ano e que acabara de produzir um “trabalho que não pode ficar na gaveta”. Suely assinalou alguns pontos a serem revisados pelo aluno como a linearidade da construção da idéia central e a limpeza de conceitos muito explorados como, por exemplo, o de midiatização. “Longas digressões são saídas pela tangente para um estudioso”, adverte ela. A professora afirma que é preciso balizar os argumentos, não se deve citar autores com muita reverência, nem se introduzir conceitos com muita naturalidade. Na réplica, o professor declarou que “a matriz cultural, às vezes, não nos permite dialogar e fazer o conflito como deveríamos, pois, invariavelmente, temos nossos pressupostos”. Depois de 25 minutos de reunião da banca examinadora, Efendy Maldonado leu a ata da defesa. Juciano obteve o título de doutor em Ciências da Comunicação, aprovado com nota 9,9.
O doutor tem um mês para entregar a versão final da tese à universidade, com as devidas correções, e pretende entregar uma cópia do estudo aos telecentros nos quais desenvolveu as pesquisas exploratórias a fim de mostrar os resultados e fazer parcerias com organizações para levar workshops até as comunidades. Outra proposta, nascida no pós-estudo empírico teórico, é repensar como a experiência conversacional vivenciada nos telecentros tem fortalecido as relações de cidadania e participação local e a partir daí desenvolver um projeto em que sejam potencializadas as características e competências comunicacionais e midiáticas dos internautas em ambientes de interação digital comunitários. O professor doutor sintetizou muito bem o a essência do trabalho em uma de suas réplicas”. Martin Barbero dizia que as pessoas iam para casa e a única janela com o mundo era a TV. Com o telecentro, as pessoas voltam para a praça e a internet é a nova janela de contato com o mundo.”